quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

BOLO DE BOLAS


Começo hoje a publicar minhas Cronicas Gastronomicas,lá vai a primeira,espero que gostem..


 Meus pais tiveram ,por alguns anos ,uma casa na Praia de Leste,litoral do Parana.
Foi lá que passei pela emoção de ver minha avó paterna ver o mar pela primeira vez. Ela ficou confusa . Quando olhava o horizonte seus olhos mareavam,olhando as pequenas ondas a seus pes ,ficava tonta e de qualquer mão espalmada fazia porto. Fui ,com prazer ,uma dessas mãos .
Alem dela estava também nesse verão sua filha ,irmã de meu pai ,minha tia Rosita. A rosa pequena, quando ainda morava com meus avós em Avaí ,interior de São Paulo ,ocupava ,em uma casa antiga e cheia de personalidade ,um quarto só seu. Duas camas ,um armário antigo e... uma penteadeira com banquinho almofadado, que eu ,menina moça ,admirava com fascínio de catedral com seus frascos de perfume e uma bailarina espanhola de porcelana ,decorada em filetes dourados ;dentro da gaveta um pote rebuscado de talco e o pompom macio que ,eu e uma prima, usávamos, espalhando no rosto o perfume e o prazer roubados do santuario em sua ausencia. Quarto de donzela ,apesar de já ser chamada solteirona. Nunca se casou de fato ,mas compartilhou sua vida com outros que precisavam dela ,por isso nunca foi rancorosa ou triste.
Mas estamos na praia,todos bem mais velhos, sou mãe ,minha mãe é avo,minha avó é bisavó,Rosita ainda é tia. O tempo foi generoso com ela...
Como em muitas casas ,o tempo de férias é o tempo do encontro, do descanso e da comilança. Rosita e minha avó formavam um par indistinto na cozinha ,nunca soube onde terminava uma e começava a outra. Tinham um prazer enorme na abundancia e na escolha de novas receitas. Uma tainha servida no almoço deixou a casa sonolenta, depois, o cheiro de café se espalhando pelos quartos,pos fim a letargia. A cozinha foi ficando pequena quando todos despertaram. Aproveitando a ocasião minha mãe anunciou que teríamos Bolo de Bolas .Que? Bolo de Bolas? Sim, receita nova!
Minha tia já sovava a massa de pão doce ;depois preparou uma bolinha pequena e mergulhou em um copo com agua,que ,como diz a cantiga de roda ,“de pesada foi ao fundo',emergindo depois de algum tempo ,avisava a todos que estava fermentada e pronta pro forno. Minha mãe ,de olho na panela de pressão ,cozinhava uma lata de leite condensado que iria se trans formar em doce de leite,poupando muito trabalho.. Antes era o fogão a lenha ,com a panela de leite e açúcar, mexida sem parar até virar doce . Hoje vamos ao mercado e compramos o doce enlatado. Poupamos tempo ,mas o que fazemos com ele? Que importa se uma receita demore mais ou menos se o objetivo é a curtição e o encontro com os que amamos?
Tia Rosita fez bolinhas com a massa toda ,depois foi abrindo cada uma na palma da mão e passando pra mamãe ,que recheava com doce de leite e fechava de novo em bolinhas. A forma ,de furo no meio, untada com manteiga e farinha ,acomodava aos poucos as bolinhas de massa recheada que a cada camada eram polvilhadas de açúcar . Vovó espantava como moscas , os dedos atrevidos que sobrevoavam o doce. No forno quente a forma foi colocada e quando o cheiro começou a se espalhar,nem foi preciso chamar,todos já estavam lá. Era mais um pão doce ,dourado e brilhante ,efeito da gema pincelada e do açúcar. As bolinhas tinham crescido e contidas pela forma se entrelaçaram,cada uma de um formato,pareciam petalas de uma flor que iamos destacando e provando ,lembrando a brincadeira “bem me quer , mal me quer,bem me quer,mau me quer...”

Denise Koprowski

Outubro 2009 Ouro Preto MG

Um comentário:

  1. Delícia de receitas, apreciei cada frase/ingrediente. Os desenhos como um túnel, levaram-me para outros tempos. Quando atualizar, avise-me. Agradecida, Ana pela indicação, estou com saudade do Atelier.beijo.

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